quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Dono de confecção é condenado a 23 anos
Por Lilian Matsuura
As oficinas de costura na cidade de São Paulo têm se tornado destino de peruanos e bolivianos. Mesmo diante de precárias condições de trabalho e da baixa remuneração, alguns deles preferem vir para o Brasil a continuar em seus países. Ainda que de forma ilegal. Em São Paulo, depois de uma denúncia, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região condenou o dono de uma oficina de costura, Moisés Cespedes Cossio, a 23 anos de reclusão, por manter trabalhadores em situação análoga a escravidão.
De acordo com depoimentos de policiais e testemunhas, foram encontrados na oficina bolivianos vivendo e trabalhando precariamente, em situação análoga à escravidão. Cossio também foi condenado por intermediar a entrada clandestina de cidadãos no país e ainda por sequestrar um adolescente, por um resgate de R$ 5 mil.
Consta no processo, relatado pelo desembargador Henrique Herkenhoff, que Cossio foi preso em flagrante pelo sequestro do adolescente boliviano. Foi aí que os policiais entraram na fábrica e verificaram a existência de trabalhadores em situação análoga à escravidão.
A irmã do rapaz, em depoimento ao juiz, disse que “trabalhava das 7h da manhã até as 22h, com uma hora de almoço e pequenos intervalos, de 15 minutos, pela manhã e a tarde. (...) Dormiam num quarto de cerca de 3x3 metros, com mais 5 pessoas, estando o quarto em condições precárias de higiene”. O adolescente disse ao juiz que trabalhou durante quatro meses e ganhou R$ 182 pelo período, o que não permitia que comprasse utensílios pessoais básicos, como escova de dente, sabonete, pasta de dente.
Um policial que participou da prisão em flagrante do dono da fábrica disse que os trabalhadores demonstraram ter “muito medo de Moisés” e que ele pagava a viagem dos bolivianos para o Brasil, descontando o valor do parco salário pago.
No voto do relator, consta que o contato com os trabalhadores era feito na Bolívia, “por intermédio de uma parente do réu”. Depois, ele pagava a passagem, os buscava na fronteiro e levava até a oficina. Os seus documentos, de acordo com o desembargador Henrique Herkenhoff, eram apreendidos e eles não tinham liberdade para sair a hora que quisessem da fábrica.
“O cerceamento de liberdade era alcançado também com ameaças feitas pelo réu, dado que as vítimas, cientes de sua clandestinidade, ficavam atemorizadas com a chegada das autoridades brasileiras”, escreveu o desembargador. “Observo o alto grau de reprovabilidade na conduta do réu, tendo em vista que o praticava com a prévia intenção de subjugar as vítimas em território estrangeiro e revelando intenso desprezo pela dignidade humana”, acrescentou.
O adolescente sequestrado e sua irmã decidiram fugir da fábrica para a casa da única pessoa que conheciam no Brasil. Um dia, quando jogava futebol, foi abordado pelo primo do dono da fábrica e levado para o local onde ficou preso. Segundo o processo, a exigência dos R$ 5 mil para liberar o rapaz foi feita para a irmã.
“Verifico a presença, contida implicitamente na denúncia, da circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso II, "a" (motivo torpe), dado que o réu sequestrou a vítima em razão de ela ter escapado do seu jugo, com a clara finalidade de intimidar as demais vítimas, sempre com o intuito de lucro”, explicou ao aumentar a pena.
No voto, acolhido pela maioria dos integrantes da 2ª Turma, o desembargador determinou o envio dos autos ao Ministério da Justiça para a possível instauração de procedimento administrativo contra o réu.
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